Senado adia votação do projeto que recria o DPVAT, o seguro das vítimas do trânsito

O seguro que cobre indenizações a vítimas do trânsito brasileiro, por lesões permanentes e mortes, foi extinto no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, deixando a população mais pobre sem cobertura

Por Ricardo Banana
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Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal decidiu adiar para a semana que vem a votação do projeto de lei que recria o seguro DPVAT (Danos Pessoais por Veículos Automotores Terrestres) e altera o arcabouço fiscal. A decisão foi anunciada pelo presidente da comissão, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), nesta terça-feira (30/4).

“Em virtude de uma conversa que tive com Rodrigo Pacheco, que anunciou reunião do Congresso Nacional para a próxima quinta (9/5), tomei a decisão de que esta reunião, em uma semana de sessão semipresencial, com poucos senadores na comissão, para não criarmos mais um transtorno, será para a leitura e vou conceder vista pelo prazo regimental como se não estivéssemos em urgência”, disse Alcolumbre.

Inicialmente, na semana passada, o presidente da CCJ anunciou que poderia dar um prazo de vista de apenas duas horas. Após falta de acordo com os parlamentares sobre o assunto, o projeto acabou adiado para esta terça-feira, sendo agora postergado novamente. O PL que cria o seguro foi aprovado pela Câmara dos Deputados.

A decisão de marcar a votação somente para a semana que vem não representa revés para o governo, já que ainda haverá tempo suficiente para votação do projeto antes da sessão do Congresso marcada para o dia 9 de maio para a análise de vetos presidenciais. Tanto é que o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), não se opôs à decisão de Alcolumbre.

A mudança no arcabouço fiscal prevista neste projeto permite que o governo antecipe um crédito de cerca de R$ 15 bilhões por causa da arrecadação além do esperado no primeiro bimestre deste ano.

A alteração foi feita por um “jabuti” – termo usado no jargão legislativo para se referir a inclusão de conteúdo que não tem ligação com o assunto original da proposta. O governo usou o projeto de lei complementar que altera o DPVAT como uma manobra para fazer a mudança no arcabouço.

O projeto é tido como prioritário, entre outros motivos, para que o governo tenha margem para retomar parte das emendas parlamentares de comissão vetadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O governo trabalha em um acordo para que cerca de R$ 3,6 bilhões dos R$ 5,6 bilhões vetados por Lula sejam restabelecidos no Orçamento.

DPVAT ESTÁ SENDO RECRIADO DEPOIS DE EXTINTO POR BOLSONARO

Acervo JC Imagem
A urgência na recriação do DPVAT acontece porque não há mais recursos para cobrir as indenizações das vítimas do trânsito em 2024 – Acervo JC Imagem

 

O DPVAT, o seguro obrigatório cobrado dos proprietários de veículos para indenizar as vítimas do trânsito, está mais perto de voltar a existir no País. A Câmara dos Deputados aprovou no início do mês de abril o projeto que reformata o seguro obrigatório de veículos terrestres, mantendo com a Caixa Econômica Federal a gestão do fundo para pagar as indenizações. O Projeto de Lei Complementar (PLP) 233/23, encaminhado pelo Poder Executivo, segue para aprovação no Senado Federal.

O seguro que cobre indenizações a vítimas do trânsito brasileiro, por lesões permanentes e mortes, foi extinto em 2019, durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), deixando a população mais pobre sem cobertura.

O texto retoma o pagamento de despesas médicas da vítima dos sinistros de trânsito com veículos motorizados (não é mais acidente de trânsito que se define) e direciona entre 35% e 40% do valor arrecadado com o prêmio do seguro pago pelos proprietários de veículos aos municípios e estados onde houver serviço municipal ou metropolitano de transporte público coletivo.

JC Imagem
Em 2021, o governo federal transferiu a gestão e operação do Seguro DPVAT para a Caixa Econômica Federal (CEF) e deixou de cobrar o seguro dos proprietários de veículos motorizados no País – JC Imagem

 

Desde 2021, a Caixa opera de forma emergencial o seguro obrigatório após a dissolução do consórcio de seguradoras privadas que administrava o DPVAT, mas os recursos até então arrecadados foram suficientes para pagar os pedidos até novembro do ano passado. Depois dessa data, a população ficou descoberta e obrigada a recorrer à Justiça para conseguir indenizações.

Com a nova regulamentação, será possível voltar a cobrar o seguro obrigatório. Os prêmios serão administrados pela Caixa em um novo fundo do agora denominado Seguro Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito (SPVAT).

PAGAMENTOS SUSPENSOS PODERÃO SER COBRADOS

Devido aos pagamentos suspensos do DPVAT por falta de dinheiro, os novos prêmios poderão ser temporariamente cobrados em valor maior para quitar os sinistros ocorridos até a vigência do SPVAT.

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Em 2020, o DPVAT teve um desconto superior a 80% para todos os proprietários de veículos motorizados – carros pagaram R$ 5,23 e motos, R$ 12,30 – NE10

 

Os valores para equacionar o déficit do DPVAT serão destinados ao pagamento de indenizações, inclusive decorrentes de ações judiciais posteriormente ajuizadas, para provisionamento técnico e para liquidar sinistros e quitar taxas de administração desse seguro.

Outra novidade no texto é a inclusão de penalidade no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) equivalente a multa por infração grave no caso de não pagamento do seguro obrigatório, cuja quitação voltará a ser exigida para licenciamento anual, transferência do veículo ou sua baixa perante os órgãos de trânsito.

Já a transferência de recursos da arrecadação com o seguro para o Sistema Único de Saúde (SUS) deixará de ser obrigatória, passando de 50% para 40% do dinheiro a fim de custear a assistência médico-hospitalar dos segurados vitimados em acidentes de trânsito.

Outro repasse previsto é de 5% do total de valores destinados à Seguridade Social para a Coordenação do Sistema Nacional de Trânsito, a ser usado na divulgação do SPVAT e em programas de prevenção de sinistros.

MAIS DETALHES DO TEXTO APROVADO NA CÂMARA DOS DEPUTADOS

O pagamento pelas despesas médicas, que sempre fez parte do DPVAT, foi mantido no texto aprovado, na forma de um substitutivo do relator, deputado Carlos Zarattini (PT-SP).

Assim, poderão ser reembolsadas despesas com assistências médicas e suplementares desde que não disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS) do município de residência da vítima do sinistro. Entre elas, custos com fisioterapia, medicamentos, equipamentos ortopédicos, órteses, próteses e outras medidas terapêuticas.

Zarattini incluiu ainda cobertura para serviços funerários e reabilitação profissional para vítimas do trânsito que ficaram com invalidez parcial.

Caberá ao Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) estabelecer os limites de valores a indenizar e quais despesas serão reembolsáveis. Desde já, o projeto deixa de fora aquelas cobertas por seguros ou planos privados de saúde; aquelas sem especificação individual de valor, prestador de serviço na nota fiscal e no relatório; ou aquelas de pessoas atendidas pelo SUS.

O texto proíbe a transferência do direito ao recebimento da indenização, seguindo-se a ordem de herdeiros do Código Civil.

INVALIDEZ PERMANENTE

No caso de invalidez permanente, o valor da indenização será calculado a partir da aplicação do percentual da incapacidade adquirida. Se a vítima vier a falecer, o beneficiário poderá receber a diferença entre os valores de indenização (morte menos incapacidade), se houver.O DPVAT previa pagamentos de despesas médicas para quem sofreu sinistros de trânsito no valor de até R$ 2.700 e indenizações por morte e invalidez de até R$ 13.500.

Caberá ao Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) estabelecer os valores de indenização vigentes para cada ano de cobertura do SPVAT, assim como:

– Percentuais para cada tipo de incapacidade parcial;
– Critérios para os serviços prestados pela Caixa, além de metodologia e forma de remuneração do banco;
– Examinará anualmente as contas do fundo;
– Estabelecerá e divulgará os valores anuais dos prêmios do seguro com base em estudo atuarial apresentado pelo agente operador; e estabelecerá diretrizes e normas necessárias ao funcionamento do fundo.

O conselho não terá, entretanto, competência para fazer revisão administrativa das decisões proferidas pelo agente operador e relacionadas à operação do seguro.

Com informações do Estadão Conteúdo

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