O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), deferiu em decisão nesta quarta-feira 1º liminar apresentada pelo jornalista Ricardo Melo e o reconduziu ao cargo de diretor-presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) até decisão final da corte.
Melo havia sido exonerado do cargo pelo governo interino de Michel Temer antes do fim de seu mandato de quatro anos, o que vai contra a lei da empresa. Ele foi nomeado por Dilma Rousseff dias antes do afastamento da presidente.
Laerte Rimoli, que assumiu o comando da EBC no lugar de Melo, exonerou até agora quase 50 gestores e funcionários sob a alegação de “desaparelhar” a empresa. Além disso, determinou o fim do uso do termo “presidenta” nas reportagens, o que Dilma classificou como “lamentável”.
Em um artigo publicado nesta quinta, a colunista do 247 Tereza Cruvinel, fundadora da EBC, que também foi demitida do cargo de comentarista e entrevistadora, faz um relato sobre o risco do futuro da empresa. Leia a íntegra:
Futuro da EBC em risco
Em nefasta combinação de prepotência e desinformação, o governo Temer atirou-se com fúria ao desmonte da EBC (Empresa Brasil de Comunicação).
Reduzi-la a uma agência de divulgação do Poder Executivo, como se cogita, será o fim da mais importante iniciativa para a democratização das comunicações, desperdiçando recursos e energias empregados para dar forma à previsão do artigo 223 da Constituição: a coexistência entre sistemas de radiodifusão privada, pública e estatal.
O governo promete uma medida provisória alterando o coração da lei da EBC. Nela, terá de dizer claramente o que pretende da empresa: comunicação pública para a sociedade ou publicidade para o governo de plantão.
Além da demissão do diretor-presidente Ricardo Melo, violando mandato garantido em lei, a intervenção atropelou o Conselho Curador (15 representantes da sociedade, quatro do governo, dois do Congresso e um dos empregados). Está em curso, a pretexto de “desaparelhar” a empresa, uma caça às bruxas que já exonerou quase 50 gestores e funcionários.
Primeira presidente da EBC, afastei-me da estatal no final de meu mandato, em 2011, retornando há três meses como entrevistadora e comentarista. Tive o contrato (modestíssimo, à prova de lorotas) suspenso numa clara seleção política que alcançou também profissionais como Luis Nassif, Paulo Moreira Leite, Sidney Rezende, Albino Castro e Emir Sader. Mas não é por isso que estou neste debate.
Presidi a diretoria inaugural que, em 2007, negociou no Congresso e implantou a empresa e a TV Brasil. Tenho responsabilidade pelo feito e compromisso com a sobrevivência do sistema público, que ultrapassa a EBC, mas tem nela o pilar central.
Em outra frente, o Ministério das Comunicações expandiu as rádios e TVs comunitárias e regulamentou as redes digitais da Cidadania, Cultura e Educação, previstas no sistema brasileiro de TV digital.
Esse conjunto formará com a EBC o sistema brasileiro de comunicação pública, não comercial e não governamental. Sobre a continuidade dessas outras ações, o governo ainda não disse nada.
A EBC explora ainda oito emissoras de rádio, sendo que algumas cobrem grandes vazios de sinal na Amazônia. Os conteúdos livres da Agência Brasil abastecem veículos nacionais e estrangeiros. Lá fora, milhões de brasileiros recebem a TV Brasil Internacional sem taxa extra de assinatura.
Por meio de unidade específica, a EBC presta ao governo serviços contratados, como transmissões da TV NBR, vitrine do Executivo similar às emissoras dos outros dois Poderes.
Com apenas oito anos de existência, a EBC não responde ainda plenamente à sua missão, mas faz diferença na paisagem. Isso explica a fúria. Muitos problemas ainda exigem solução.
A TV Brasil nunca teve rede própria no sistema analógico, pois ao nascer o espectro já fora todo ocupado por emissoras privadas. Só terá cobertura nacional no sistema digital, o que demanda tempo e dinheiro. Como elevar a audiência com tão precária distribuição?
Livres do jugo publicitário e dos interesses políticos, os canais públicos existem, aqui e em outros países, para garantir a expressão dos sem-voz e da diversidade social, política e cultural.
A EBC vem sustentando programação dessa natureza, mesmo com limitações técnicas, de inovação ou linguagem. Que emissora comercial aberta oferece tantas horas de boa programação infantil?
Caberá também à sociedade, e não só ao governo, decidir sobre o futuro da EBC: aprimorar o que foi feito ou jogar tudo fora? Essa é a questão agora.
Artigo publicado na Folha de S. Paulo (247)
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