Luciano Hang foi condenado no STJ por montar sua “contabilidade com racionalidade germânica a serviço do crime”, conforme palavras que constaram da manifestação da subprocuradora do MPF, Ela Wiecko de Castilho.PUBLICIDADE
A menção a “germânica” extraída de documento público assinado pelo MPF parece que tenta remeter à origem alemã do pai de Luciano, que é de raiz italiana por parte de mãe.
Em 1998, a PF o flagrou declarando importação de 1,9 tonelada de tecidos, mas quando os policiais abriram o contêiner, encontraram 3 toneladas, ou seja, pagava quase um terço menos de imposto do que era devido, só nesta carga.
Impossível saber quantas vezes ele tinha feito isso. Apurou-se que a estratégia envolvia 14 pessoas, entre elas um primo, contadores, fiscais do INSS e da Receita Federal, apontados, em documentos públicos e oficiais, como cúmplices de uma orcrim – a clássica organização criminosa.
O conhecido “véio” contratou para defendê-lo uma legenda do Direito, o experiente advogado Nabor Bulhões. O preferido de Fernando Collor, Marcelo Odebrecht, Paulo César de Farias e o governo da Itália, que o contratou para obter a expulsão de Cesare Battisti.
Luciano sempre negou que seja criminoso – não quis falar com o DCM quando procurado para dar sua versão dos fatos. A negativa, porém, está nos autos dos processos consultados.
Ali aparece até um truque para sonegar: importação de 60 dúzias de tesouras a 1,20 cada. Aí a empresa dele trocava de 60 x 12 x 1,20, para 60 x 1,2.
O Ministério Público Federal documentou todos os crimes dos quais acusou Luciano e o caso foi parar no STJ. Ali, ele pediu até habeas corpus, que nem era a medida processual adequada e, por isso, não obteve resultado.
Depois desta denúncia, novos escândalos foram denunciados em outros processos igualmente públicos.
Neste primeiro processo o “Véio” foi condenado a três anos, mas desviou da pena ao aderir ao programa de parcelamento REFIS, em que fez o célebre acordo para pagar os tributos que devia em 115 anos.
Em uma das decisões, constou que seria bom impedir a condenação “para não manchar o nome do negócio” – apresentamos Havan, a limpa.
É impossível falar de Luciano Hang sem mostrar a luta dele e seus advogados em tribunais por 21 anos para escapar de condenações criminais que deveriam fazer com que ele e todos os outros empresários devedores nacionais fossem responsabilizados por dívidas públicas.
O caso mais emblemático entre 38 na área federal é o processo número 2003.72.00.010174-2.
Este corre em sigilo. Toda a investigação iniciou-se no ano de 2000 em Blumenau, relativa a crimes de lavagem de dinheiro e outros contra o sistema financeiro.
Como mais à frente se verá, o processo iniciou sua tramitação na Justiça Federal de Florianópolis no ano de 2003, sendo que depois de muitos pedidos de vistas, adiamentos, inúmeros recursos, o processo levou mais de uma década.
Não foi possível encontrar os registros da tramitação deste processo na Vara de Florianópolis, mas é certo que a condenação foi superior à 14 anos.
Aí, em junho de 2008, ele recorreu ao TRF-4, aquele que bateu em Lula à jato.
Em 27/11/2008 foi pautado para julgamento no dia 10/12/2008. Parecia rápido, né? No dia 10 de dezembro, o julgamento ganhou seu primeiro adiamento.
No dia 17/02/2009 foi realizada a sessão de julgamento, sendo que um dos desembargadores pediu vistas do processo – pediu vistas, você sabe, significa adiar tudo.
Em maio de 2009, saiu uma decisão diminuindo condenação. E novo adiamento.
Com esta mini vitória, começou a saga dos advogados de uma das bancas mais caras do Brasil. Embargos de declaração tiveram o condão de jogar o caso para ser julgado de novo mais de um ano depois, em 27 de julho de 2010, reduzindo a pena para 9 anos e 4 meses.
Passou, mesmo devagar, pelo TRF-4, segunda condenação. LH não gostou do resultado. Recorreu ao STJ. O recurso só chegou lá 10 meses depois, em maio de 2011.
Caiu nas mãos do ministro Jorge Mussi, também catarinense. O caso ficou aguardando por uma análise por exatos 43 meses, sem nenhuma movimentação, demais até para a morosidade do STJ.
Em maio de 2015 o caso foi redistribuído para outro ministro. Em 02/09/2015 o recurso da defesa aliviou ainda mais a situação do LH, se sabe de quanto, pois a decisão não foi disponibilizada na íntegra, mas sabemos que foi mantida a condenação.
Dessa decisão, Luciano entrou com novo recurso, em 15/09/2015, um agravo regimental. Nos meses seguintes o agravo caiu de novo nas mãos de Mussi.
Aí LH pediu embargos de declaração. Novo sorteio livre, deu Mussi na cabeça. Em 30 de novembro de 2015 o caso saiu das mãos de Mussi para embargos de divergência.
Cansado de ler o juridiquês?
Não se preocupe. O caso acaba aqui. Em junho de 2016 a defesa pediu prescrição do caso. É claro que esta saiu rapidinha, em setembro estava no forno.
Depois de 16 anos de investigações e dezenas de embargos, LH é um cidadão livre, sem dever nada à Justiça, salvo pelo gongo.
Luciano, portanto, não foi absolvido das acusações do Ministério Público Criminal porque foi considerado inocente.
O que aconteceu foi que os ministros reconheceram a prescrição (a impossibilidade de punir por conta do tempo transcorrido) que beneficiou o “Véio” e, talvez por isso, a pecha lhe seja tão pertinente. (Luis Muller)