Utilizando estratégia inédita na advocacia brasileira e que no jargão futebolístico se traduz em “a melhor defesa é o ataque”, o advogado Cristiano Zanin Martins já denunciou à ONU as violações e atos ilícitos de que seu cliente, o ex-presidente Lula, tem sido vítima, que se enquadram no fenômeno denominado “lawfare” por cientistas políticos da Universidade de Harvard e entrou com processo de abuso de autoridade contra o juiz Sérgio Moro, que preside o processo.
“Ele fez pré-julgamento de Lula”, diz o advogado nessa entrevista exclusiva à TV 247, transmitida ao vivo no Facebook do 247. O processo corre em sigilo determinado pelo próprio juiz Moro. Embora ele seja adepto da abertura dos sigilos e já tenha defendido publicamente vazamentos para a imprensa em artigo em que comparou a Lava Jato à italiana Mãos Limpas. Para Zanin, tanto o trâmite do impeachment da presidente Dilma quanto o processo contra o ex-presidente Lula caracterizam estado de exceção.
“O Tribunal Regional Federal da 4ª. Região decidiu que a Lava Jato poderia atuar fora das regras legais”, afirma ele, “ou seja, fora da constituição”.
O calendário indica para abril do próximo ano a oitiva das testemunhas de defesa no primeiro dos cinco processos contra Lula, mas não é possível determinar quando sairá a sentença. O ex-presidente ficará impedido de concorrer em 2018 se até lá for condenado em segunda instância em algum dos processos.
Por outro lado, “se a ONU entender que houve violações grotescas poderá haver sanções, uma delas é a reparação dos danos causados à vítima, no caso, o ex-presidente Lula e até um pedido público de desculpas por parte dos ofensores”.
Boa noite, Cristiano Zanin Martins, muito obrigado por falar ao vivo na TV 247 com transmissão ao vivo pelo facebook. Participam da entrevista os jornalistas Leonardo Attuch e Alex Solnik. Gostaria de começar com a seguinte questão. O ano chega ao fim com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva réu em cinco ações penais, duas no Paraná, três em Brasília. Qual o balanço que o senhor faz desse quadro?
Boa noite Leonardo, boa noite Solnik, boa noite a todos que estão nos assistindo. Eu penso que o grande destaque que deve ser dado nesse momento é que após a realização de diversas audiências com oitiva de 27 pessoas em Curitiba e 11 testemunhas em Brasília, o resultado foi altamente favorável, porque nenhuma das testemunhas da acusação conseguiu comprovar a tese do Ministério Público, a tese da denúncia. Então, esse é o fato que eu gostaria de destacar. É lógico que hoje nós temos cinco ações penais, ações que foram propostas com grande velocidade. A última ação penal, por exemplo, entre a data em que nós prestamos esclarecimentos e a data do recebimento da denúncia foram sete dias úteis, ou seja, são ações propostas com grande velocidade, sem um processo de apuração efetivo e, aparentemente, o que se busca é dar volume às acusações e não fazer acusações que efetivamente têm um lastro, têm materialidade.
Eu gostaria então de comentar ação por ação. A mais conhecida de todas diz respeito ao famoso tríplex. Em que estágio está essa ação? O que aconteceu desde o seu início até agora?
Essa é uma ação em que o Ministério Público Federal acusa o ex-presidente Lula de ter recebido vantagens indevidas provenientes de três contratos firmados entre a OAS e a Petrobrás, e essas vantagens indevidas teriam sido pagas através de um tríplex no Guarujá e através de um armazenamento de bens do acervo presidencial. Pois bem, neste ano nós tivemos várias audiências em Curitiba e foram ouvidas, como eu já disse aqui, 27 testemunhas selecionadas pelo próprio Ministério Público, testemunhas de acusação, portanto. Dentre elas, aqueles famosos delatores da Lava Jato, todos aqueles que se tornaram conhecidos por serem delatores da Lava Jato. E nenhuma dessas pessoas apontou qualquer fato que pudesse comprovar, primeiro, que o ex-presidente tenha recebido qualquer vantagem indevida proveniente desses contratos da Petrobrás e muito menos que ele seja dono do tríplex no Guarujá. Ao contrário, os próprios delatores não mencionaram qualquer fato que pudesse envolver o ex-presidente em relação a esse foco de corrupção.
Quem é o proprietário do apartamento?
Esse apartamento foi assumido… a construção do prédio foi assumida pela OAS – originariamente era da Bancoop, em sistema de cooperativa – num processo que teve a participação do Ministério Público de São Paulo e do Poder Judiciário de São Paulo. A OAS constrói o prédio e essa unidade que é atribuída ao ex-presidente Lula pertence à OAS e sempre pertenceu. Ele nunca foi proprietário. Ele visitou o imóvel – isso, inclusive, foi esclarecido pelo próprio ex-presidente – ele visitou, ele esteve uma única vez no imóvel, para ver se tinha interesse e dona Marisa foi duas vezes no imóvel. Só que o casal recusou a compra. Poderia ter comprado e poderia, se tivesse comprado, ter usado o crédito que dona Marisa havia pago à Bancoop anteriormente, quando ela tinha uma quota. Dona Marisa pagou de 2005 a 2009 à Bancoop. Se o casal tivesse decidido pela compra, teria que pagar pelo apartamento e poderia usar, em tese, parte daquele crédito que já havia sido pago. Mas a decisão foi por não comprar. Quem é o dono é quem consta no registro de imóveis. É a OAS.
Mas as reformas não foram feitas para agradar o ex-presidente Lula e dona Marisa, as famosas reformas de 2 milhões?
De forma alguma. E as testemunhas que foram ouvidas nessas audiências mostraram exatamente isso. O que a OAS queria? O ex-presidente esteve no apartamento, não gostou do apartamento, a OAS por conta dela fez reformas – aliás, algumas das reformas eram até mesmo para corrigir obras do apartamento. A própria engenheira responsável disse que uma parte das reformas foi para corrigir, por exemplo, infiltrações que havia no apartamento. Então, não era para personalização do apartamento para o ex-presidente, ao contrário, era para corrigir vícios da própria construção e também fazer algumas adaptações da disposição do apartamento a fim de verificar se o ex-presidente teria interesse na compra. Só que mesmo depois que foram feitas, enfim, essas obras a decisão foi de não comprar esse apartamento.
Há um depoimento mais recente do zelador que foi o último, no qual ele afirma que todo mundo sabia que o imóvel era do ex-presidente Lula. Houve até um confronto na audiência. O que o senhor diria desse depoimento?
Bom, eu dividiria o depoimento dele em duas partes. Sobre a afirmação de que todos sabiam, isso era, claramente, uma fofoca, tanto é que a engenheira da OAS prestou depoimento antes dele, no qual reconheceu, a partir de uma pergunta que eu fiz a ela que era fofoca, e era uma engenheira que foi ao imóvel de 2014 a 2016 mais de 120 vezes! Então, ela conhecia o prédio, sabia, efetivamente, o que se passava no prédio e declarou, sob compromisso com a Justiça que aquele apartamento não era, efetivamente, do ex-presidente Lula. Havia fofocas, mas fofocas pode haver em qualquer lugar. Isso não transforma alguém em proprietário de imóvel. O que disse esse zelador foi que todos sabiam, mas quando eu perguntei a ele quais eram os elementos de que ele dispunha para atribuir a propriedade ao ex-presidente, ele não soube dizer. Não tinha qualquer elemento objetivo que pudesse respaldar essa afirmação. É preciso lembrar que testemunha depõe sobre fatos. A testemunha não está lá para dar a sua impressão pessoal sobre determinado assunto. E foi isso que ocorreu. Ele deu uma impressão pessoal dele, que não poderia sequer ter dado, porque a lei impede que se tenha esse comportamento e o juiz permitiu que a testemunha desse a sua impressão pessoal e mais: permitiu que ela pudesse ofender tanto ao ex-presidente Lula como a mim, na condição de seu advogado. O juiz preside a audiência, o juiz tem que ter o controle e tem que impedir que as pessoas que estão na audiência sejam ofendidas.
Qual foi a ofensa?
A testemunha, como todo mundo viu – inclusive, isso passou até na televisão, a Globo exibiu isso várias vezes – a testemunha se referiu a mim e ao ex-presidente Lula como lixo, “bando de lixo”. Então, isso jamais poderia ter ocorrido…
O que o juiz deveria ter feito?
O juiz deveria ter paralisado a audiência no momento em que as ofensas foram feitas e advertido a testemunha de que ela não poderia se comportar daquela forma. Mas, ao contrário, não só isso não ocorreu – a testemunha pôde prosseguir nas suas ofensas – como, ao final, o juiz pediu desculpas à testemunha! Como se ela tivesse uma carta branca para ofender as partes e os advogados que lá estavam atuando no processo.
Isso vai motivar alguma reclamação da parte de vocês?
Olha, nós levamos não só esse fato, mas teve também o desdobramento. Como eu já disse, ao final o próprio juiz não só permitiu que houvesse essas ofensas, como acabou ali tentando criar um clima absolutamente desnecessário, fazendo considerações após a oitiva dessa testemunha. Então, esses fatos todos já foram comunicados à Ordem dos Advogados do Brasil que poderá, se entender que houve algum tipo de infração legal, tomar as providências cabíveis.
Isso foi antes ou depois que vocês abriram o processo contra o juiz Sergio Moro?
Na verdade, isso ocorreu depois, tanto é que quando ele faz referência, ali, após o término do depoimento ele se refere, dentre outras coisas, à ação que o ex-presidente Lula move contra o juiz Sérgio Moro, que é uma queixa-crime por ter cometido, em tese, abuso de autoridade.
Ele questionou se isso iria se repetir em relação à testemunha… que vocês processam delegados… juiz… procuradores… eventualmente poderiam processar a testemunha. Aí o senhor colocou: qualquer pessoa que se julgue lesada em algum direito tem o direito de buscar reparação. Foi mais ou menos isso o que aconteceu?
Exatamente isso. Quando houve o questionamento eu mostrei ao juiz Sérgio Moro que ninguém está acima da lei nem tem imunidade para praticar atos ilícitos, mesmo que isso ocorra em relação às autoridades. As autoridades também têm um limite de atuação na lei que é a constituição federal. Extrapolado esse limite as autoridades também passam a ser… podem ser questionadas através de ações. E isso não se pode simplesmente deixar passar em branco. É preciso lembrar que essa ação, por exemplo, contra o juiz Sérgio Moro decorre de atos gravíssimos. O ex-presidente Lula em março foi conduzido coercitivamente ao aeroporto de Congonhas, sem ter deixado de atender qualquer intimação, e isso a lei coloca como premissa para a condução coercitiva. Ele teve os seus telefones interceptados e mais do que isso: as ligações interceptadas foram divulgadas em rede nacional, não só os relatórios como os áudios, inclusive conversas conosco, com seus advogados, assim como ocorreram diversos outros fatos bastante graves, que configuram violações às garantias fundamentais do ex-presidente Lula, essas mesmas violações também são objeto daquele comunicado feito em julho junto à ONU, porque, claramente, enfim, colocam a pessoa, o jurisdicionado sem as garantias fundamentais que a constituição lhe garante.
Houve muitas dúvidas em relação àquela condução coercitiva, principalmente devido ao local escolhido, o aeroporto de Congonhas e não a sede da Polícia Federal. Vocês conseguiram apurar porque isso aconteceu? Ele seria levado a Curitiba?
Isso eu não sei afirmar, mas o que eu posso dizer é que o fundamento da decisão, naquele momento, era garantir a segurança do ex-presidente Lula. Só que o aeroporto de Congonhas, ao meu ver, é um dos lugares mais vulneráveis, seja pelo volume de pessoas que passam ali diariamente, seja porque o local específico onde ele foi levado, que é a chamada sala das autoridades é um local que tem todas paredes de vidro. E, num determinado momento, claramente, os próprios delegados que ali estavam ficaram receosos de que pudesse haver um grave incidente. Então, não era um local apropriado, não assegurava a segurança das pessoas que ali estavam, então, essa é uma dúvida que só o juiz Sérgio Moro um dia poderá esclarecer.
Os senhores nunca inquiriram o juiz a respeito?
Olha, na verdade, o que nós impugnamos, a irresignação é contra a própria condução coercitiva. O local para onde ele foi levado só demonstra e reforça o descabimento da medida. Agora, o que é importante sublinhar é que aquela providência era absolutamente desnecessária e sem amparo legal, porque ele jamais havia deixado de atender a uma intimação.
Eu queria retornar, então à ação mais conhecida, que é essa do tríplex. Quais são os próximos passos? O senhor mencionou 27 testemunhas, as quais praticamente todas isentaram o ex-presidente Lula de qualquer responsabilidade, exceto o zelador. Estaria mais ou menos 26 a 1. Agora vêm as testemunhas de defesa? Qual o prazo para essa ação?
Eu só gostaria de fazer um registro, Leonardo, porque ao meu ver foram as 27. Você não pode extrair do depoimento frase isolada, principalmente se essa frase não está confirmada por qualquer elemento objetivo que a testemunha apresente.
Em outros momentos ele inocentou o presidente Lula?
Na verdade, ele só deu impressões pessoais dele que não têm lastro em nenhuma prova, em nenhum elemento concreto. Então, por exemplo, ele disse que todas as unidades tinham um responsável. Se tivesse algum problema numa unidade ele tinha que se comunicar com o responsável. Eu perguntei a ele quem era o responsável por essa unidade 164-A. Ele disse, evidentemente, que era a OAS. Que a OAS é a proprietária desse imóvel. Então, se você analisar no conjunto esse depoimento do próprio zelador, ele não dá qualquer elemento concreto que possa confirmar a acusação.
Então, na visão da defesa todos os 27 depoimentos inocentam Lula?
Se analisados na sua integralidade mostram claramente não só que o tríplex não era do ex-presidente Lula, mas também que ele jamais participou de qualquer ato de corrupção na Petrobrás.
Agora vêm as testemunhas de defesa. Quantas testemunhas de defesa?
O Ministério Público apresentou 27 testemunhas, nós temos um rol que tem um número similar ao do Ministério Público, e também os outros réus vão poder ouvir as suas testemunhas. Já foram marcadas audiências em fevereiro e março para ouvir as testemunhas de defesa e nós também continuamos insistindo na realização de uma prova pericial. Porque além dessas testemunhas de acusação não terem confirmado qualquer participação do ex-presidente nesses contratos que teriam sido fraudados, nós também queremos mostrar que não há qualquer situação ou valor oriundo desses contratos que tenha cabido direta ou indiretamente ao ex-presidente por meio de uma prova pericial e o juiz indeferiu essa prova pericial e nós vamos continuar insistindo para realizar essa prova pericial para deixar muito claro que ele jamais recebeu, direta ou indiretamente qualquer benefício decorrente de contrato da Petrobrás ou de qualquer outro ato de corrupção.
Em que momento deve surgir a primeira sentença?
É uma estimativa difícil de fazer porque você tem, como eu disse, variáveis. As testemunhas, em tese, terminarão de ser ouvidas entre março e abril do próximo ano, mas isso não encerra a fase de instrução. É possível ainda que outros atos de instrução sejam necessários e aí só mais adiante poderemos fazer o prognóstico quanto à data de uma eventual sentença.
O senhor teme que o ex-presidente Lula seja condenado, a despeito de tudo que aconteceu?
O que nós temos claramente presente é que o juiz Sérgio Moro fez pré-julgamento em relação ao ex-presidente Lula. Isso está claro em vários despachos, decisões e até mesmo num documento que ele encaminhou ao Supremo Tribunal Federal, a pretexto de se justificar daquela violação das conversas telefônicas. Pré-julgamentos já ocorreram. Agora, se esses pré-julgamentos vão se transformar em condenação sem prova, eu espero que não, porque nós estamos lidando com o bem mais precioso de uma pessoa que é o seu direito à liberdade. Então, você não pode, jamais, impor uma condenação a alguém sem que ele tenha praticado crime.
O senhor teme uma crônica de uma morte anunciada?
Se você tem pré-julgamento e tem essas violações diversas – expus algumas aqui – é evidente que estamos diante de um processo que tramita fora das normas da constituição federal.
E o processo contra o juiz Moro? Qual é o trâmite dele? E quem vai julgar? O STF?
O processo contra o juiz Moro, infelizmente, eu não posso falar nada porque o tribunal colocou em regime de sigilo. Nós, inclusive, pedimos ao juiz Moro que abra mão desse sigilo, mas, até agora não houve manifestação. Então, eu não posso, nesse momento, falar nada a respeito desse processo em virtude do regime de sigilo que foi imposto pelo Tribunal Regional Federal da 4ª região.
O senhor acha que ele poderá abrir mão do sigilo tendo em conta que ele defende a transparência?
O que nós pedimos a ele é o seguinte: nós entendemos que quem defende a transparência deve oferecer a transparência. Por ora estamos também impedidos de fazer qualquer comentário sobre esse processo.
Hoje numa entrevista o advogado Geoffrey Robertson, que trabalha com a defesa diz que o ex-presidente Lula não terá um julgamento justo nas mãos do juiz Sérgio Moro. O senhor concorda?
Concordo. Aliás, não está tendo. As audiências deixam claro que há um tratamento bastante diferente entre acusação e a defesa. E esse, aliás, é um dos itens do comunicado que nós fizemos à ONU. Porque nós levamos naquele comunicado a violação de três disposições do pacto internacional de direitos civis e uma dessas disposições que nós entendemos violada é aquela que assegura um julgamento justo e imparcial. Então, nós entendemos que houve violação e continua a haver violação, na medida em que o juiz que preside e que deu início ao processo contra o ex-presidente Lula não tem, com o devido respeito, pelos atos já praticados, pelo histórico do processo, a isenção e imparcialidade necessária para seguir o julgamento.
Qual tem sido a repercussão internacional dessa iniciativa junto à ONU?
Olha, as pessoas, diversos especialistas que já tiveram acesso a esse comunicado entendem que efetivamente as violações que nós apresentamos estão bem caracterizadas, estão muito bem configuradas. É evidente que nós vamos agora enfrentar um juízo de admissibilidade que está relacionado ao fato da ONU aceitar ou não analisar essas violações, se não houve o exaurimento formal dos abusos no Brasil.
O governo brasileiro já se manifestou?
O governo brasileiro irá se manifestar no dia 27 de janeiro. A ONU tinha dado, inicialmente, dois meses para o governo se manifestar e depois prorrogou por mais um mês.
Por que? O governo não conseguiu apresentar a sua manifestação a tempo?
Nós na verdade vamos atualizando também o pedido e a própria ONU houve por bem dar mais um mês.
O que a ONU pode fazer? Repreender o juiz Moro? Quais são as sanções previstas?
Se nós superarmos a admissibilidade… é preciso só esclarecer o seguinte, quer dizer, embora não tenha havido o exaurimento formal de todos os recursos, nós entendemos que é necessário um remédio eficaz para paralisar as violações. O julgamento do ex-presidente Lula já começou e o juiz Sérgio Moro continua presidindo. Quando o Supremo Tribunal Federal devolveu os processos ao juiz Moro para que ele analisasse as próprias violações que ele cometeu, nós entendemos que nesse momento não havia mais recurso eficaz e por isso levamos a questão das violações à ONU. Então, nós entendemos que estão presentes os requisitos da admissibilidade. Se a ONU admitir ela vai começar a instruir o processo e poderá, se entender que houve as violações apontadas condenar o Brasil. Se ela entender que foram violações grotescas ela poderá não só exigir que o Brasil restabeleça as garantias do ex-presidente Lula, como adotar outras providências que estão estabelecidas nos regramentos da própria ONU. Uma delas, inclusive é a reparação dos danos causados à vítima, no caso, o ex-presidente Lula e até um pedido público de desculpas por parte dos ofensores.
Já que o senhor mencionou a questão da reparação, houve outra iniciativa do ex-presidente Lula que foi um processo indenizatório contra o procurador Deltan Dellagnol em que ele pede 1 milhão de reais. Por que foi tomada essa decisão?
Porque nós entendemos que aquela entrevista televisiva do power point configura um ato ilícito que viola a honra, a imagem e a reputação do ex-presidente Lula. Veja, o processo penal não pode ser confundido com um processo midiático. Procurador e promotor devem fazer as suas acusações no processo, devem protocolar a denúncia e seguir o trâmite legal. Não existe essa figura do promotor ou do procurador que acusa na televisão. Muito menos com adjetivações e termos tais como aqueles que foram usados por esse procurador da República em relação ao ex-presidente Lula. Você promove não só um pré-julgamento da pessoa, como coloca a sociedade de forma a praticamente exigir a condenação da pessoa porque ela recebe do procurador aquelas afirmações como se fosse uma verdade, como se houvesse já uma condenação.
O Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, saiu em defesa do Ministério Público, argumentando que, quando um procurador é atacado toda a instituição também é atacada. O senhor concorda com isso?
Absolutamente, não se pode por um ato tido como ilegal de um procurador colocar a instituição contra o cidadão, contra um jurisdicionado. Senão você transforma a atividade do ministério público numa atividade de vingança, numa atividade de retaliação e isso é evidente que colide com o estado democrático de direito e é papel do próprio Ministério Público defender o estado democrático de direito. E jamais colocá-lo em risco, jamais colocá-lo em cheque.
Além dessa inciativa de vocês existem outras quatro ações contra o ex-presidente Lula: mais uma no Paraná referente a um suposto terreno para o Instituto Lula e uma suposta cobertura em São Bernardo do Campo e três ações em Brasília. Eu gostaria, então, que o senhor falasse dessa segunda ação no Paraná, a que ela diz respeito?
Olha, a segunda ação que foi proposta agora, recentemente, é uma ação que foi proposta a partir de um relatório da Polícia Federal que foi elaborado um dia após nós termos apresentado as declarações do presidente Lula. Nós apresentamos as declarações do ex-presidente numa sexta-feira às 8 e meia da noite e na segunda-feira seguinte já existia um relatório de 142 folhas indiciando o ex-presidente Lula. Ou seja…
A defesa foi ignorada na sua opinião?
Foi ignorada. Deu-se oportunidade pró forma para a defesa e o que aconteceu? Quatro dias úteis depois do relatório já havia uma denúncia pronta e quatro dias depois da apresentação da denúncia já havia uma decisão. Então…
Na sua opinião, então, nem o juiz nem o Ministério Público leram a defesa?
Eu acho que ninguém prestou atenção. Eu acho que foi simplesmente ignorada. E já havia algo preparado para o oferecimento dessa denúncia. O contraditório foi simplesmente formal. Você não consegue montar uma acusação dessas pós uma investigação que tenha sido realizada com as cautelas necessária num prazo tão exíguo. Então, essa acusação foi montada dessa forma e dentro desse lapso temporal. Pois bem, qual a imputação feita? Que o ex-presidente Lula teria recebido vantagens indevidas da Odebrecht através de um imóvel onde seria instalado o Instituto Lula e através de um apartamento vizinho ao apartamento que é dele e onde ele mora e que está registrado no nome dele. Então, o que foi esclarecido? Primeiro, que o Instituto Lula funciona num sobrado que era o antigo IPET Instituto de Pesquisas do Trabalhador desde 1990. Nunca funcionou nesse imóvel que consta da denúncia.
A quem pertencia esse imóvel?
Esse imóvel, na verdade, teve uma série de proprietários, a Odebrecht foi proprietária e hoje a proprietária é uma concessionária de veículos.
Nunca passou pelo Instituto Lula?
Nunca passou! Ao contrário, na verdade, quando houve a oferta desse imóvel e a consulta se o Instituto Lula gostaria de comprar a diretoria rejeitou a compra, inclusive com base em estudo técnico que indicava que aquele prédio não serviria para a instalação do instituto e também para o Memorial da Democracia que havia um projeto de se fazer. O Instituto Lula nunca funcionou lá, nunca teve qualquer disponibilidade desse imóvel. Em relação ao apartamento, o ex-presidente Lula aluga o apartamento que fica contíguo ao que pertence a ele. Paga aluguel. Então, dizer que pertence a ele é ignorar a realidade dos fatos. É mais uma acusação que nós refutamos como frívola, acusação sem materialidade e que faz parte daquilo que nós temos dito sempre: isso é “lawfare”. É quando as autoridades elegem um inimigo político e passam a utilizar procedimentos jurídicos para perseguir esse inimigo.
Vocês usaram esse termo “lawfare”…isso cria a percepção de que essa operação tinha o ex-presidente Lula como alvo desde o seu início ou os fatos foram levando ao ex-presidente?
Olha, o que eu vejo é o seguinte: a Lava Jato tem o seu mérito de ter identificado o foco de corrupção que já existia há muito tempo, provas colhidas mostram isso.
Há quanto tempo mais ou menos?
Olha, na verdade as testemunhas ouvidas faziam referência à década de 90.
Governo Collor ainda…
É… isso é bastante antigo. Inclusive, há citações de fatos durante o governo que antecedeu o próprio governo do ex-presidente Lula mostrando que havia um problema ali, era de longa data e que foi identificado pela Lava Jato. Então, a Lava Jato teve esse mérito. Agora, a partir daí começou a haver uma perseguição clara contra o ex-presidente Lula, não só lançando diversas suspeitas indevidas em relação a ele, como violando as suas garantias fundamentais. Então, esse processo do “lawfare” funciona da seguinte forma: você joga sobre o seu inimigo político diversas suspeitas, são abertos inúmeros procedimentos e processos para que essa pessoa seja vista na sociedade como culpado, embora ninguém saiba do que ele é culpado e para que essa pessoa fique com o seu tempo completamente ocupado, respondendo a depoimentos, preparando defesas jurídicas e aí a pessoa sai de sua atividade principal, que, no caso do ex-presidente Lula é a política. Então, ele perde muito tempo que poderia dedicar à política, organizando a sua defesa jurídica.
Falando nisso, o ex-presidente Lula alega que um dos objetivos é retirá-lo de uma próxima disputa presidencial. Para que isso aconteça ele tem que ser condenado em primeira e segunda instância. O senhor acredita que haja essa finalidade?
Eu entendo que há uma motivação política e ela vem vindo desde agora, porque não só você tem, ao meu ver, essa intenção de uma condenação de uma forma a inviabilizar uma candidatura, como você tem já neste momento esse prejuízo causado à atividade política. Então, quando você tem abertura sucessiva, nós tivemos abertura de ação em julho, setembro, outubro e duas em dezembro. Tudo isso com depoimentos, etc e tal. Então, você já tem um prejuízo claro à atividade política e isso deverá, na visão daqueles que participam dessa operação, possivelmente servir para, num futuro próximo eliminar a possibilidade de uma candidatura de acordo com a legislação.
Qual é o estágio das ações de Brasília?
Em Brasília existe uma ação que é a chamada “compra do silêncio de Cerverò”. Qual é a acusação que o Ministério Público fez a partir de uma delação premiada do senador cassado Delcídio do Amaral? Acusaram o ex-presidente Lula de ter tentado interferir ou impedir a delação premiada de Nestor Cerverò. Pois bem. As testemunhas ouvidas naquela ação, testemunhas de acusação, inclusive o próprio Nestor Cerverò, disseram que o ex-presidente Lula jamais fez qualquer interferência no processo de delação premiada do Nestor Cerverò. Ao contrário: o Nestor Cerverò, depondo em juízo disse que quem tentou influir na delação dele foi o próprio senador cassado Delcídio do Amaral.
Ou seja, o Delcídio, então, teria atirado no ex-presidente Lula para se preservar?
Sim, isso, na verdade, dito pelo Nestor Cerverò.
Isso não provocou o trancamento do processo?
É um processo que ainda está em andamento e eu acredito que, com os depoimentos ali colhidos isso ficou claro que era mais uma acusação frívola, uma acusação sem materialidade e o resultado disso só pode ser a absolvição do ex-presidente Lula. Então, essa ação, que já teve encerrado o ciclo de oitivas das testemunhas de acusação, também é outra ação que não tem um ato que possa confirmar a acusação. Então, o desfecho só pode ser a absolvição. Em relação a uma outra ação penal que também tramita em Brasília diz respeito a uma suposta interferência na concessão de uma linha de crédito de 7 bilhões de reais em favor da Odebrecht no BNDES e que teria gerado como contrapartida um plano de saúde para um irmão do ex-presidente Lula e o valor correspondente a duas palestras que ele fez em Angola.
Não há uma desproporção? Sete bilhões por um plano de saúde?
Isso salta aos olhos. Quer dizer, fora essa desproporção, primeiro que fazer uma acusação dessa é ignorar todo um sistema que existe dentro do BNDES do qual participam mais de cinquenta profissionais gabaritados, que fazem as análises de créditos etc e tal, então, você desconsidera tudo isso.
Sendo que a Odebrecht, como a maior empreiteira do país não precisaria de interferência de ninguém para conseguir um crédito no BNDES.
Sem dúvida! Teria condições de conseguir o seu financiamento, demonstrando que tinha as condições técnicas para isso. E, por outro lado, também se demonstrou que as palestras que o ex-presidente Lula fez em Angola foram comprovadas. Então, quando Ministério Público diz que são supostas palestras isso também choca com a realidade, porque a realização das palestras também está comprovada. É mais uma acusação que você de cara verifica que ela não se sustenta.
Há alguma acusação séria mesmo ou são todas desse jeito?
São todas assim. Todas as acusações, ao nosso ver, fazem parte desse fenômeno que é o “lawfare” e esse fenômeno justamente se utiliza de acusações frívolas e sem materialidade.
O “lawfare” é praticado em países democráticos ou em regimes autoritários?
Olha, pode acontecer. Hoje é um fenômeno muito estudado no exterior…
Em que países já aconteceu?
…principalmente os grandes especialistas estão em Harvard, nós estivemos em Harvard conversando com alguns desses especialistas e eles, por exemplo, mostram isso ocorrendo na África e em outros países…
Que têm regime ditatorial?
Não necessariamente.
Democracias pouco sólidas?
Não necessariamente, porque é uma forma de você perseguir o inimigo político num formato aparentemente legítimo. Porque quando você tem um processo judicial você pressupõe que ele vá…
Defesa, acusação e neutralidade…
…dar as garantias inerentes ao processo. Só que quando você está dentro desse processo de “lawfare” você elimina isso, o processo ou o procedimento é apenas uma formalidade.
Isso aconteceria também em Brasília, na sua visão? Porque vocês já entraram com ações em relação ao juiz Moro, do Paraná e em relação ao juiz Vallisney, vocês enxergam o mesmo espírito de perseguição ao ex-presidente Lula?
Nós vamos fazer uma avaliação, essa é uma ação em que ainda não houve citação, quando houver a citação…
Porque é uma personalidade menos pública, vamos dizer assim, menos conhecida.
Na verdade, nós sempre temos que fazer a análise a partir do todo. Verificar o teor da decisão que baseou a denúncia… se existe algum pré-julgamento… nós temos que fazer uma análise completa e global do processo a fim de verificar se há algum pré-julgamento ou não. As providências adotadas não são contra A ou B, são contra autoridades que extrapolam no exercício de suas funções. Pouco importa quem são essas autoridades.
Tudo isso que o senhor está narrando a respeito do julgamento ou pré-julgamento do ex-presidente Lula me parece muito semelhante com o que aconteceu com a presidente Dilma no impeachment. Existe esse paralelismo na sua opinião entre os trâmites da Lava Jato em relação a Lula e o impeachment? Uma coisa ajuda a outra, de certa maneira. Por exemplo, esse ambiente de suposta perseguição ao ex-presidente Lula contribuiu para o processo do impeachment na sua visão pessoal?
Eu acho que são fatos que se relacionam na medida em que no meio do processo em que buscaram retirar a presidenta Dilma houve uma violência contra o presidente Lula, que foi o fato de ele ter sido impedido de tomar posse como ministro sob o fundamento de que ele era investigado na Lava Jato. Então, naquele momento o ex-presidente Lula não era indiciado, não era réu e muito menos condenado.
Hoje existem vários indiciados, indiciados, não, mas citados em delações da Lava Jato no governo Temer…
Então, nós tivemos recentemente um julgamento no Supremo que caminhou por uma solução totalmente diferente. E naquele momento, em março, quando o ex-presidente Lula foi nomeado uma liminar do ministro Gilmar Mendes impediu que ele tomasse posse simplesmente porque ele era investigado lá em Curitiba. Então, eu acho que esse fato, que é um fato bastante conectado com o processo de impeachment, porque certamente o ex-presidente Lula poderia ter ajudado a presidenta Dilma a recompor o governo e a tomar as medidas que o Brasil precisava naquele momento, é um fato bastante relevante. Como outros. Na medida em que você tem a inobservância da constituição federal e das leis você parte para um estado de exceção. Essas características de estado de exceção você consegue ver tanto no processo de impeachment quanto nesses processos que dizem respeito ao ex-presidente Lula.
O ex-presidente do Supremo, Joaquim Barbosa classificou o impeachment como “encenação”. De certa maneira o senhor diz que o julgamento do ex-presidente Lula também é uma encenação, ou seja, estamos vivendo num estado aparente de direito?
Olha, infelizmente eu acho que o estado de direito está bastante comprometido. E mais do que isso: essa situação, inclusive, foi recentemente formalizada numa decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª. Região, na qual o tribunal, por maioria de votos, por 13 votos contra 1 disse que a Lava Jato não estava obrigada a seguir as regras gerais. Ou seja, não está obrigada a seguir a lei. Quando um tribunal profere uma decisão como essa, na minha visão ele está formalizando o estado de exceção. Porque não só a Lava Jato como qualquer processo, qualquer procedimento, especialmente na área penal tem que seguir a legalidade estrita, não existe a possibilidade de abrir exceções para processar alguém, notadamente na área penal.
Eu gostaria de colocar um ponto: vocês têm uma estratégia de comunicação bastante peculiar. A cada decisão vocês soltam notas imediatamente, o senhor já gravou vídeos no youtube, existem sites sobre o ex-presidente Lula, por que vocês têm buscado essa comunicação direta com a sociedade?
Primeiro, porque o ex-presidente Lula é uma pessoa conhecida nacional e mundialmente e as pessoas ouvem essas notícias sobre essas denúncias sem sequer saber o que está se passando, sem conhecer a realidade dos fatos. E infelizmente nós vemos a cobertura da chamada grande imprensa privilegiando a acusação, privilegiando a palavra dos procuradores e dos juízes que atuam nos casos em detrimento da defesa. Então, essa situação nos leva a optar por outros meios de comunicação a fim de que as pessoas também possam saber qual é a defesa do ex-presidente Lula, qual é a verdade dos fatos, para que as pessoas possam fazer seu próprio juízo de valor e não ficarem presas a um editorial de um jornal A ou aquilo que é dito na televisão B.
O senhor tem ideia de como acontecem os vazamentos de delações que vão para as manchetes dos jornais?
Nós fizemos alguns pedidos de investigação sobre vazamentos relativos a essas delações. É evidente que esses vazamentos estão em desacordo com a lei, deveriam ser investigados e punidos, porque quando você faz o vazamento de uma delação, você cria, gera, manchetes, gera condenações das pessoas por manchetes de jornais, quando, na verdade, a delação não tem valor jurídico de prova, a lei estabelece dessa forma e o Supremo Tribunal Federal já confirmou que delação não é prova, delação é meio de obtenção de prova. Então, o fato de haver delação A ou B não significa que a pessoa tenha cometido um crime, só que a imprensa toma isso muitas vezes como a verdade absoluta, aquilo que supostamente está em elação – aliás, é preciso registrar que não só vazam delações, como vazam também expectativas de delações – então, isso é um absurdo, porque você acaba maculando a honra e a imagem das pessoas, sem que se saiba exatamente o que foi dito e sem que tenha qualquer prova, porque delação não é prova.
O próprio juiz Sergio Moro já defendeu vazamentos para a imprensa em artigo que escreveu sobre a Operação Mãos Limpas. Não seria ele o grande vazador?
Essa acusação eu não posso fazer, evidentemente porque não tenho nenhum elemento de prova para fazê-la. Eu também não poderia incorrer no mesmo vício, na mesma ilegalidade que eu atribuo a pessoas que agem dessa forma. Então, o que existe em relação ao juiz Moro é um artigo de 2004, quando ele analisou a Operação Mãos Limpas em que ele enaltece o vazamento de informações relativas às investigações, como forma de fragilização dos atores políticos e como meio de impor condenações que não seriam possíveis sem que tivesse essa fragilização.
Não é uma confissão?
Se você pegar aquele artigo e aquela tese, aquilo é “lawfare”. E é o que acontece, acredito eu, nos processos da Lava Jato.
No momento presente o Brasil vive a expectativa das delações da Odebrecht. Onde já surgiram nos jornais algumas notícias relativas ao ex-presidente Lula. Por exemplo, a acusação de Emilio Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht de que o Itaquerão teria sido um presente ao ex-presidente Lula. O senhor acredita que delatores da empreiteira foram de alguma maneira pressionados a citar o ex-presidente Lula e de que maneira o senhor vê essa acusação relacionada ao Itaquerão?
Com relação à pressão para fazer referência ao ex-presidente Lula, como eu disse antes, nós fizemos três pedidos à Procuradoria Geral da República para que investigasse a forma como estavam sendo conduzidas essas delações porque havia notícias, a própria imprensa tinha publicado notícias de que havia uma pressão para que os delatores fizessem referência ao nome do ex-presidente Lula, sob pena de não ter a delação aceita. Por exemplo, o jornal Folha de S. Paulo fez duas reportagens nas quais ele diz exatamente isso. Parece que há necessidade de investigar, sim se houve, como condição de aceitação da delação premiada qualquer referência ao nome do ex-presidente Lula. De outro lado, voltando àquilo que nós conversamos no início todos os delatores da Lava Jato já negaram qualquer participação do ex-presidente Lula em esquemas, enfim, em ações de corrupção no âmbito da Petrobrás. Então, de duas uma: ou os delatores todos estão errados e vão ter que sofrer algum tipo e sanção ou é a Lava Jato que prossegue nessa hipótese sem dar uma prova que está certa, não dá para conciliar um discurso que a força tarefa da Lava Jato sobre essa suposta participação do ex-presidente Lula com os elementos de prova colhidos até o momento em juízo. Inconciliáveis.
E o Itaquerão?
O Itaquerão, diz a reportagem que seria uma forma de presente, mas isso não existe, imaginar que o Itaquerão seja um presente ao ex-presidente Lula, quer dizer, ele consegue levar o Itaquerão para um lugar?
Mas poderia trazer dividendos políticos, por exemplo. Embora não seja dele a propriedade, foi uma realização. Uma realização que agradou a uma parcela da sociedade.
Isso não faz nenhum sentido do ponto de vista jurídico, porque ou a pessoa tem a disponibilidade, os atributos da propriedade ou não é dela. Agora, fora isso, primeiro que isso é uma especulação, não tem nenhuma delação que tenha essa afirmação, é uma especulação de delação. É uma especulação vazada e, portanto, já fora do procedimento que a lei estabelece. E terceiro que, como eu disse, do ponto de vista jurídico isso não faz nenhum sentido, não só no que tange ao direito de propriedade, que o ex-presidente teria alguns atributos em relação à propriedade daquele estádio, como também você não tem nenhuma conexão com um ato ilícito por ele praticado. Então, o que a Lava Jato teria que provar é que o ex-presidente Lula praticou um ato ilícito, recebeu valores indevidos por conta disso e isso teria sido pago através, por exemplo, de uma propriedade. Todo esse histórico teria que ser coberto com provas. Só que não existe nenhuma prova nesse sentido. E não existe por uma única razão: porque ele não praticou nenhum ato ilícito.
Há suposições de que essa mega delação da Odebrecht já estaria pronta antes do impeachment e só divulgada depois. O senhor acredita nessa versão ou tudo foi feito a toque de caixa mesmo?
Eu não posso fazer uma avaliação das delações da Odebrecht porque eu não participei. Agora, que os atos estão sendo feitos a toque de caixa isso eu tenho certeza que estão. Eu trouxe um exemplo concreto: uma denúncia que foi gerada, que foi gestada e recebida num período de sete dias úteis. Então, isso é inadmissível. Indica que não houve investigação, na verdade se colocou numa denúncia uma hipótese sem nenhuma prova e essa hipótese foi recebida pelo juiz abrir uma ação penal sem nenhuma prova. Não se consegue fazer uma investigação num prazo de sete dias úteis.
Pra gente encerrar essa entrevista eu queria levantar uma questão: muitas pessoas imaginavam que em 2016 o ex-presidente Lula estaria condenado e preso. Nada disso aconteceu. O que o senhor espera para 2017 em relação ao seu cliente mais importante que é o ex-presidente Lula?
Com relação a essas expectativas eu posso dizer para você que, do ponto de vista jurídico elas são absurdas, porque você imaginar a condenação ou a prisão de uma pessoa sem que ela tenha praticado um crime e sem que haja provas da prática desse crime é um absurdo e isso atenta contra as garantias fundamentais, atenta contra o estado de direito. Em relação ao próximo ano eu tenho um prognóstico de que, a partir desses depoimentos já colhidos que, eu repito, são depoimentos que envolvem os principais delatores da Lava Jato, então, a partir desses depoimentos eu tenho a expectativa de que o ex-presidente Lula tenha a sua inocência reconhecida em cada um dos processos. É claro que eu tenho a consciência de que esses processos têm um alto componente político. Agora, esse componente político não pode se sobrepor às provas e àquilo que diz respeito à lei.
Quer dizer, tecnicamente o senhor espera absolvição, mas politicamente o senhor teme por uma eventual condenação.
Se vier uma condenação eu posso afirmar, pelo cenário já existente que ela será uma condenação ilegítima e que terá o objetivo claro de implementar ou consolidar uma perseguição política. (247)
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