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Mais dois peixes-leão foram capturados em Pernambuco. Lindos, sem predador e com apetite voraz para devorar peixes, invadiram mares da Flórida e do Caribe e agora colocam em risco os do Brasil
Pescadores de Itamaracá, no Litoral Norte do Grande Recife, em Pernambuco, capturaram dois peixes-leão no último dia 26 de fevereiro, um domingo. Os animais caíram em uma armadilha de pesca conhecida como corvo. No dia seguinte, segunda (27), mais um foi encontrado no estado vizinho da Paraíba.
Os dois exemplares encontrados no litoral pernambucano foram entregues às autoridades da prefeitura da cidade. Os pescadores sabiam a importância do gesto: o peixe-leão (lionfish em inglês) é uma espécie invasora, venenosa, com alta capacidade de reprodução e apetite raro para devorar pequenos frutos do mar e peixes até maiores do que ele.
Invasor recente, o peixe-leão não tem predadores na cadeia alimentar no mar do país. Como não faz parte da biodiversidade brasileira, os predadores locais ainda não o reconhecem como presa. Por isso, se não for contido, poderá se transformar, em pouco tempo, numa ameaça real ao equilíbrio de várias espécies do ecossistema e da biodiversidade marítima do Brasil. O estrago poderá ser considerável, sobretudo, no entorno de ilhas e arquipélagos
Outro detalhe preocupa: invasor recente, a espécie não tem predadores na cadeia alimentar do mar no país. Como não faz parte da biodiversidade brasileira, os peixes e animais maiores locais ainda não o reconhecem como presa. Por isso, se não for contido, ela poderá se transformar, em pouco tempo, numa ameaça real ao equilíbrio de várias espécies da biodiversidade marítima do Brasil. O estrago poderá ser considerável, sobretudo, no entorno de ilhas e arquipélagos, alertam o pesquisador. Infelizmente, o ritmo da invasão começa a acelerar.
Ironicamente, o peixe-leão é um dos mais belos seres vivos dos oceanos. Desejado anteriormente por criadores de todo o mundo, tem barbatanas exuberantes e corpo marcado por pequenas bolas e cores, do marrom ao amarelo, passando por vermelho e azul, às vezes alternadas por listras brancas ou em tons mais claros. Sua beleza atrai desavisados para o perigo.
Ele nada pausadamente, com elegância suprema. Adulto, atinge em média entre 25 e 30 centímetros de comprimento. No contato com o ser humano, o risco fica por conta do conjunto dos 18 espinhos venenosos que carrega, naturalmente disfarçados, no dorso e nas regiões pélvica e anal.
O peixe-leão não toma a iniciativa de atacar humanos, mas interagir com ele é perigoso. Seus espinhos têm uma peçonha, um veneno, que provoca vermelhidão, dor de cabeça, tontura, náuseas, necrose na área atingida e, no limite, gera convulsões e choque anafilático
“O peixe-leão não toma a iniciativa de atacar humanos, mas interagir com ele é perigoso. Seus espinhos têm uma peçonha, um veneno, que provoca vermelhidão, dor de cabeça, necrose na área atingida e, no limite, gera convulsões e choque anafilático”, alerta a coordenadora do Projeto Conservação Recifal, Gislaine Lima. Náuseas, fraqueza muscular, disfunção muscular ofegante, dor intensa e edema no local são outros sintomas comuns.
O primeiro acidente com um peixe-leão na costa brasileira foi registrado em Barroquinha, no litoral norte do Ceará, em abril de 2022. Um pescador teve sete perfurações no pé ao pisar em um deles num cercado de pesca, informou o Diário do Nordeste. Foi internado com febre e convulsões. Barroquinha fica na divisa com o Piauí, outro estado onde ao menos um exemplar da espécie foi encontrado.
O peixe-leão é uma espécie nativa do Indo-Pacífico, faixa oceânica que vai do Pacífico, entre a costa da América do Sul e a Austrália, até o litoral leste da África. Na década de 1980, conseguiu se estabelecer no Oceano Atlântico. Antes das localizações em Pernambuco, Paraíba, Piauí e Ceará, cinco exemplares haviam sido capturados em águas brasileiras. Dois no litoral de Arraial do Cabo, na Região dos Lagos do Estado do Rio, um no arquipélago de Fernando de Noronha e outros dois em armadinhas de servidores a 200 quilômetros de distância do litoral do Amapá, na pluma do Amazonas, área de contato da água doce do rio com sal do mar.
No caso de Arraial do Cabo, especialistas suspeitam que o exemplar tenha sido deixado ao mar por algum criador, mas isso não foi comprovado. Em um estudo publicado pela revista especializada internacional Biological Invasions, sete investigadores brasileiros analisaram as possibilidades de entrada, soltura ou nascimento da espécie na faixa oceânica do país.
“Há indícios concretos do início do processo de invasão. O alarme está dado. Precisamos orientar a população e os servidores. Autoridades devem tomar atitudes desde já”, destacou, logo após a captura em Fernando de Noronha, em entrevista ao R7, de Darwin, na Austrália, o biólogo marinho brasileiro Osmar J. Luiz, pós-doutor pela universidade Macquarie, de Sydney, pesquisador da também australiana Charles Darwin University e coautor organizador do estudo.
No Indo-Pacífico, o peixe-leão tem vários predadores naturais, entre eles algumas espécies de tubarão e garoupa. Fora dali são invasores bonitões, mas perigosos. As primeiras localizações da espécie como invasora em águas do mundo foram identificadas em 1985, na costa sul da Flórida, nos Estados Unidos. De acordo com cientistas, esses exemplares provavelmente foram soltos por donos de aquários descontentes com o comportamento da espécie, de comilão de outros peixes.
Quando ele invade outros ambientes, as presas demoram a reconhecê-lo como inimigo não fogem, facilitando sua ação. Seus possíveis predadores também custam a identificá-lo como presa. Enquanto isso, a população da espécie se expande fulminantemente e faz a festa onde se instala
Em duas décadas, eles se tornaram uma praga por lá. Alastraram-se pela costa leste americana e, a partir de 2005, tomaram as praias do Golfo do México e de todos os países banhados pelas águas cristalinas do Mar do Caribe. Rumaram em seguida para o litoral da Venezuela, próximo à costa norte do Brasil. Em outra ponta, vindos do Mar Vermelho e do Canal de Suez, passaram a devorar também o que viam pela frente no Mar Mediterrâneo, entre a Europa e a África.
O peixe-leão é um mesopredador, ou seja, um predador de porte médio. Devora peixes de pequeno e médio porte e, em sua voracidade particular, até alguns maiores do que ele, não tão bons nas tarefas de defesa. “Quando ele invade outros ambientes, as presas demoram a reconhecê-lo como inimigo e não fogem, facilitando sua ação. Seus possíveis predadores também custam a identificá-lo como presa. Enquanto isso, a população se expande fulminantemente e faz a festa onde se instala”, explica o pesquisador brasileiro. “Por tudo isso, nas costas americana e caribenha, eles reduziram e continuam a comprometer a sobrevivência de espécies, sobretudo endêmicas, que existem apenas em um ponto”.
A rápida invasão das águas caribenhas serve de lição. Os lionfishes dominaram as praias de Trinidad e Tobago, no sudeste do Caribe, em 2012. Dois anos depois, em maio de 2014, mergulhadores e pesquisadores da Universidade Federal Fluminense (UFF) capturaram um exemplar de 25 centímetros num costão de rochas da Prainha, em Arraial do Cabo, no Rio de Janeiro. Em fevereiro de 2016, o segundo foi pego no Saco das Neves, no litoral da mesma cidade.
Mais de seis mil quilômetros separam o sudoeste do Caribe do litoral fluminense. Por isso, os estudiosos, no início, achavam difícil que eles tivessem chegado até as águas exuberantes da Região dos Lagos fluminense nadando, sem terem sido localizados antes, no caminho. A hipótese mais aceita para esses exemplares de Arraial do Cabo também é a soltura por donos de aquário. Mas agora, diante dos casos recentes no litoral nordestino, até mesmo essa tese é colocada em dúvida.
O peixe-leão se reproduz com fluência espantosa. As fêmeas desovam todos os meses. Cada uma delas é capaz de liberar até dois milhões de ovos em um ano