Governo e empresas querem convencer Anvisa a liberar cruzeiros

Por Ricardo Banana
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Viagens estão suspensas até 21/1 devido a surto de Covid em navios. Setor alega risco de perder R$ 1,7 bi se temporada não for retomada

Em um vídeo gravado numa praia de Dubai, nos Emirados Árabes, o ministro do Turismo, Gilson Machado, demonstrava empolgação ao anunciar a temporada 2021/22 de cruzeiros marítimos no litoral brasileiro. Era 2 de outubro do ano passado, e o ministro previa uma “temporada belíssima” – a anterior havia sido cancelada devido à pandemia do novo coronavírus, e o clima era de recomeço. Cerca de três meses depois, no entanto, a variante Ômicron parece ter jogado um balde de água fria nas expectativas, e o setor suspendeu as viagens, na última segunda-feira (3/1), ao menos até o próximo dia 21 de janeiro.

A decisão foi tomada após recomendação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que identificou 829 infecções de Covid-19 entre tripulantes e passageiros das embarcações que operam no país, somente nesta temporada. Desse total, 798 casos foram confirmados recentemente, num curto espaço de nove dias, entre 26 de dezembro e o último dia 3.

Para evitar maiores perdas para o setor, o governo federal trabalha para que os cruzeiros retomem o mais breve possível. Mais 138 viagens estão previstas para acontecer no litoral do país até o fim da temporada 2021/22, em abril. O dado foi levantado pelo Metrópoles junto à Associação Brasileira de Terminais de Cruzeiros Marítimos (Brasil Cruise) e considera todas as que já estavam marcadas para ocorrer após o dia 21.

Os trajetos percorrem toda a costa brasileira, com navios da MSC e da Costa Cruzeiros, as duas únicas empresas que participam desta temporada no Brasil. As companhias foram procuradas para confirmar as escalas, mas evitaram dar maiores informações.

Em conversa com o Metrópoles, o presidente da Brasil Cruise, Carlos Eduardo, explica que as escalas previstas no site da associação podem ser mudadas ou canceladas devido à crise sanitária. “Estão sendo alteradas com uma frequência jamais vista”, pondera.

Ele estima um prejuízo enorme para o setor com a suspensão das atividades. De acordo com dados fornecidos pelo Ministério do Turismo, a temporada de cruzeiros marítimos que começou em novembro do ano passado tinha uma previsão inicial de movimentar mais de 360 mil turistas, com impacto de R$ 1,7 bilhão, além da geração de 24 mil empregos.

“Este pode ser o segundo ano parado. Os terminais ficaram mais de um ano sem operação. A chance de a gente começar a se recuperar seria com essa temporada, que a gente sabia que ia ser menor, mas teria”, afirma o presidente da Brasil Cruise.

“Agora vamos torcer para retomar e evitar um prejuízo maior. Não acredito que toda a temporada deva ser suspensa por causa da Covid-19. Na indústria do turismo, o segmento que mais foi prejudicado pela pandemia foi o cruzeiro marítimo. Foram desmanchados mais de 20 navios. Então, hoje o setor trabalha para ter essa retomada, e os protocolos deverão ser mais rigorosos”, prossegue Carlos Eduardo, por telefone.

Enquanto o empresário diz esperar protocolos mais rígidos, Gilson Machado, do Turismo, se mobiliza para que a Anvisa afrouxe as regras. O ministro quer aumentar o percentual de infecções toleradas nas embarcações. “É preciso adequar [a portaria] com a Ômicron, porque ela não está gerando pressão nos hospitais”, disse, ao jornal Folha de S. Paulo.

Em entrevista ao Radar Econômico, da Veja, Machado afirmou esperar que “a baixa letalidade e a alta transmissibilidade leve à imunidade de rebanho e ao fim da pandemia”.

Em nota ao Metrópoles, o Ministério do Turismo informou que permanece participando de reuniões no âmbito do governo federal com municípios, estados e empresas para juntos reavaliarem a possibilidade do retorno das atividades “no menor tempo possível”.

“Cabe registrar que qualquer decisão será tomada por parte das autoridades sanitárias competentes à luz de critérios técnicos condizentes com o cenário epidemiológico do país e amparados em práticas já seguidas em outras partes do mundo para que, desta forma, possamos garantir segurança de turistas e tripulações desta que é uma atividade extremamente importante para o turismo e a economia do país”, assegurou a pasta.

A recomendação da Anvisa teve como fundamento o aumento vertiginoso dos casos de Covid-19 a bordo das embarcações nos últimos dias, que indica uma mudança radical do cenário epidemiológico. “Esse aumento pode ser confirmado pelos dados disponíveis, que dão conta da detecção de 31 casos de Covid-19 nos 55 dias iniciais da temporada (de 1º/11 a 25/12), com uma explosão acentuada a partir do dia 26/12, tendo sido registrados 798 casos em apenas nove dias (de 26/12 a 3/1), o que representa um aumento de 25 vezes nesse período”, registrou a agência.

A Anvisa reforça que, em agosto do ano passado, já havia se manifestado pela inviabilidade da retomada da temporada de navios de cruzeiro no Brasil, a qual deveria estar condicionada à avaliação do cenário epidemiológico do país.

“As recomendações e ações por parte da agência foram pautadas em critérios técnicos e sanitários, a partir das melhores evidências disponíveis e com fundamento no princípio da precaução, com a finalidade de reduzir o risco de ocorrência de agravos à saúde. Assim, a Anvisa segue atuando de acordo com a sua missão institucional de promover e proteger a saúde da população”, complementa.

A Associação Brasileira de Navios de Cruzeiros (Clia Brasil) explicou ser importante que haja convergência entre os protocolos dos navios e os acordos feitos com as autoridades.

A Costa Cruzeiros disse, diante da suspensão da temporada, oferecer a opção de transformar o valor pago pelo cruzeiro em um voucher de crédito a ser utilizado até 31 de dezembro de 2022 para embarques até 30 de junho de 2023. “Também será oferecida a alternativa de reembolsar todo o valor pago pelo cruzeiro a ser executado nos prazos da lei 14.046 de 2020 (suas alterações e prorrogações)”, prosseguiu a empresa.

(Metrópoles).

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