Usada antes da pandemia principalmente para tratar piolhos, a ivermectina passou a ser receitada por médicos como preventivo ou para fases iniciais da covid-19. Não há, no entanto, comprovação científica do uso do vermífugo para combater o novo coronavírus. Um estudo clínico brasileiro sobre o tema só deve ser concluído em 2021, e a distribuição do medicamento por agentes públicos é considerada irregular por especialistas.
Na onda de respostas milagrosas para crise de saúde, a droga ganhou força ainda em abril, com a publicação de um estudo na Antiviral Research que indicou que o fármaco foi capaz de inibir a replicação do SARS-CoV-2 in vitro (em laboratório). Os pesquisadores alertaram, porém, que, para ter efeito em humanos, a dose teria de ser 10 vezes maior.
“Esse resultado quase inviabiliza o uso em humanos porque aumenta muito a dose, daí aumenta a chance de ter efeitos no sistema nervoso central e pode ter efeitos adversos desconhecidos porque ela [ivermectina] nunca foi usada nessa dose”, afirmou ao HuffPost a consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) Raquel Stucchi.
Informe da SBI sobre uso de medicamentos para covid-19 diz que “os antiparasitários ivermectina e nitazoxanida parecem ter atividade in vitro contra a SARS-CoV-2, porém ainda não há comprovação de eficácia in vivo, isto é, em seres humanos. “Muitos dos medicamentos que demonstraram ação antiviral in vitro (no laboratório) não tiveram o mesmo benefício in vivo (em seres humanos). Só estudos clínicos permitirão definir seu benefício e segurança na covid-19”, diz o texto.
Os resultados preliminares de uma triagem de drogas no Instituto de Ciências Biomédicas da USP (Universidade de São Paulo) divulgados em artigo preprint (sem revisão por pares) na última sexta-feira (10) mostram que tanto a ivermectina quando a nitazoxanida, os dois vermífugos apontados como possíveis curas para a covid-19, não tiveram desempenho satisfatório. As drogas eliminaram o vírus das amostras, mas também mataram as células.
Conhecida no Brasil pelo seu nome comercial “Annita”, a nitazoxanida é uma das apostas do governo de Jair Bolsonaro. Em abril, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) lançou um estudo clínico para testar o uso da droga na prevenção e tratamento da covid-19. A meta é recrutar 500 pacientes com sintomas leves e outros 500, com sintomas graves.
A iniciativa foi motivada por um estudo do Laboratório Nacional de Biociências – vinculado ao MCTI – em colaboração com a Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), segundo o qual o vermífugo reduziu em 94% a carga viral do SARS-CoV-2 em células in vitro.
Como a ivermectina ficou popular na pandemia?
Nos últimos meses, o uso da ivermectina passou a circular em mensagens nas redes sociais e foi defendido pelo presidente Jair Bolsonaro. “Eu acho que o resultado é até melhor que a cloroquina, porque mata os vermes todos”, disse Bolsonaro em uma live de 11 de junho. O que há em comum entre os dois medicamentos é a falta de comprovação científica para combater o novo coronavírus.
Vídeos de médicos que circularam entre a população foram decisivos na disseminação da ideia de uma solução fácil para a crise sanitária. Um vídeo publicado pela médica Lucy Kerr, em defesa da ivermectina, teve quase 400 mil visualizações em uma semana e foi excluído pelo YouTube. O conteúdo foi classificado como “enganoso” pelo projeto Comprova.
Fonte: Huffpostbrasil