BH receberá projeto que introduz a bactéria Wolbachia no mosquito Aedes aegypti

Por Ricardo Banana
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Um projeto inovador voltado para reduzir a transmissão da dengue, da zika e da febre chikungunya está previsto para ser desenvolvido em Belo Horizonte em meados de 2018. Trata-se da introdução da bactéria Wolbachia no mosquito Aedes aegypti, vetor das doenças, e que é capaz de evitar que os vírus sejam transmitidos para os seres humanos durante a picada.

O projeto Eliminar a Dengue: Nosso Desafio (Eliminate Dengue: Our Challenge) é um projeto internacional sem fins lucrativos que surgiu na Austrália e usa a bactéria Wolbachia. Atualmente há trabalhos de campo do projeto em cinco países e outros três estão se articulando para aderir. No Brasil, ele foi trazido pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), com o apoio o Ministério da Saúde. A iniciativa está entre os trabalhos científicos apresentados na 69ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que ocorre ao longo dessa semana na capital mineira.

No Brasil, os trabalhos começaram em duas áreas pequenas: em Jurujuba, bairro de Niterói; e em Tubiacanga, bairro do Rio de Janeiro. A liberação de mosquitos com a bactéria começou em agosto de 2015 e se encerrou em janeiro do ano passado. Desde então, vem ocorrendo um monitoramento semanal, com mosquitos sendo coletados em armadilhas e levados ao laboratório para verificar se  possuem a Wolbachia.

Autosustentabilidade e segurança

“Mais de um ano e meio após nós pararmos de liberar mosquitos nestas duas localidades, uma vez que mais de 90% deles contêm a bactéria. Isso comprova a autosustentabilidade do projeto. Não precisamos ficar voltando à mesma área para fazer novas liberações”, explicou o pesquisador da Fiocruz Luciano Moreira, coordenador do projeto no Brasil.

Dados similares também foram constatados na Austrália onde, nas áreas onde os trabalhos começaram, em 2011, perto de 100% da população do Aedes já registra a Wolbachia.

Isso ocorre porque a fêmea do Aedes que possui a Wolbachia em seu organismo irá transmiti-la a todos os seus descendentes, mesmo que se acasale com machos sem a bactéria. Além disso, quando apenas o macho possui a Wolbachia, os óvulos fertilizados morrem. Dessa forma, a bactéria é transmitida naturalmente para as novas gerações de mosquitos.

Moreira destaca que o projeto não envolve nenhuma modificação genética, nem no mosquito e nem na bactéria. Além disso, a iniciativa não elimina o mosquito do meio-ambiente, apenas substitui uma população capaz de transmitir doenças por outra incapaz. “É uma iniciativa totalmente segura. Estudos já mostraram que a Wolbachia não oferece riscos à saúde humana, ainda que o mosquito pique uma pessoa”.

De acordo com o pesquisador, a Wolbachia está presente naturalmente em 60% dos insetos, mas não no Aedes aegypti. O que o projeto faz é uma introdução artificial da bactéria no mosquito. “Quando o Aedes com a bactéria pica alguém que está com dengue, zika ou febre chikungunya, ele adquire o vírus. Mas esse vírus precisa se replicar dentro do mosquito. Para isso, ele precisa entrar nas células onde as bactérias já estão. O que provavelmente acontece é uma competição entre a bactéria e o vírus por nutrientes e outros componentes que ambos necessitam. E no final a Wolbachia, que já estava instalada ali, vence a disputa”, explica.

Próximo passo

O próximo passo do projeto no Brasil é a sua expansão no Rio e em Niterói, já que as áreas atingidas até então nestas duas cidades envolviam populações pequenas, entre três e quatro mil pessoas. Em Niterói, já estão sendo liberados mosquitos em uma área com 270 mil habitantes.

No Rio de Janeiro, o trabalho começa em agosto, em dez bairros. Nos meses seguintes, outras regiões da cidade serão incluídas e a previsão é que, até o final de 2018, o projeto já tenha alcançado uma área onde vivem 2,5 milhões de pessoas. A preparação já começou, através de campanhas de comunicação visando o esclarecimento e o envolvimento da população, cujo apoio é essencial, pois algumas casas recebem armadilhas para coleta dos mosquitos.

A inclusão de Belo Horizonte no projeto no ano que vem começará pela região da Pampulha e pela região norte, áreas que têm cerca de 840 mil habitantes no total.

Estudos epidemiológicos

A Fiocruz ainda não realizou estudos epidemiológicos para avaliar se de fato ouve redução do número de casos de dengue, zika e febre chikungunya com o projeto. De acordo com Luciano Moreira, este tipo de pesquisa precisa envolver áreas grandes. Ele diz que a Indonésia começou a desenvolver um estudo com esta proposta em agosto do ano passado, em uma área de 500 mil habitantes. Os primeiros resultados devem sair em 2019, mostrando se houve ou não redução do número de infectados pela doença antes e depois da liberação dos mosquitos.

Ainda assim, evidências apontam para a diminuição dos casos. “Em todos os países envolvidos, há mais de 40 localidades onde já houve liberação de mosquitos. Em nenhuma delas foi observada ocorrência de surtos, isto é, muitos casos em determinada área. É um indício de que o projeto está funcionando”, disse o pesquisador.

Um estudo diferente será conduzido no Rio de Janeiro a partir dessa nova etapa. Em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde, a Fiocruz fará um acompanhamento para comparar o número de casos nos bairros abrangidos pelo projeto com o número de casos nos demais bairros. A expectativa é se perceba uma diferença nos locais onde houver mosquitos com a Wolbachia. (247)

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