Celso Daniel é salto no escuro de Sergio Moro

Por Ricardo Banana
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imagemQuatorze anos depois, por iniciativa do juiz Sérgio Moro, o caso que envolve o sequestro e a execução do prefeito Celso Daniel, de Santo André, retorna à pauta da mídia.

A tentativa de vincular crime ocorrido em 2002 às denúncias investigadas pela Lava Jato é um grande salto no escuro, sem nenhuma relação com fatos e provas que envolvem a morte do prefeito.

Só para esclarecer qual é a discussão. Não conheço quem seja capaz de negar a existência de um esquema de corrupção, troca de favores e pagamentos de propina em Santo André, na gestão de Celso Daniel, num universo comum ao de grande parte das prefeituras e governos brasileiros. A questão sempre foi ligar o assassinato do prefeito à corrupção. Isso nunca foi demonstrado.

No quesito homicídio, a denúncia sempre foi um grande fiasco. Só permanece como “assunto” em função da boa vontade sem escrúpulos da mídia grande para divulgar e ampliar toda e qualquer denúncia capaz de prejudicar Lula e o Partido dos Trabalhadores, sempre que se consegue criar — artificialmente — uma oportunidade.  A Lava Jato é só a mais recente.

Não custa lembrar que o crime sempre teve um aspecto político inevitável, até em função do personagem e do momento. Ocorreu em janeiro de 2002, no pré-início de uma campanha presidencial onde Luiz Inácio Lula da Silva era o candidato favorito desde o primeiro dia. Celso Daniel estava deixando a prefeitura para assumir a coordenação do programa de governo.

Num ritmo coerente com a gravidade do caso e sua elevada repercussão num ano eleitoral, o caso foi apurado e  encerrado, do ponto de vista policial, ainda no primeiro semestre de 2002. Em duas investigações, a Polícia Civil e a Polícia Federal, que entrou no caso por ordem de Fernando Henrique Cardoso, concluíram que havia ocorrido um crime comum e que a tese de que Celso Daniel fora vítima de  homicídio encomendado não parava de pé.

Ainda assim, em agosto daquele ano, o Procurador Geral da República, Geraldo Brindeiro, rompeu com a fama de engavetador e apresentou denúncia ao Supremo contra integrantes do PT. Se a denuncia fosse aceita, o julgamento iria ocorrer nas semanas que antecediam o primeiro turno da eleição presidencial. Olha só o que poderia acontecer. Mas, sorteado para o caso, o ministro Nelson Jobim descartou a acusação como simples “denuncismo”, esse tipo de mau jornalismo que tenta compensar a falta de investigação pelo excesso de sensacionalismo. A reação de Jobim, categórica, poderia ter servido de alerta. Nada disso.

Em 2005, no início da AP 470, o caso foi requentado novamente. O Ministério Público de São Paulo conseguiu reabrir uma nova investigação, feita por uma equipe independente da Polícia Civil, chefiada pela respeitada delegada Elizabeth Sato. O azar é que ela também concluiu que os fatos não apontavam na direção de crime encomendado. Mesmo assim, entre um depoimento e outro,  delegados e acusados foram chamados a Brasília para animar uma das CPIs que produziam manchetes sobre o Mensalão.

O argumento do Ministério Público era que Celso Daniel resolvera acabar com a corrupção na administração e teria sido morto por um bando de auxiliares inconformados. Podia até fazer sentido, para quem era capaz de imaginar que a degeneração do PT tivesse chegado ao ponto de cometer homicídios. Mas faltavam fatos e provas que, com o passar dos anos, transformaram o caso numa versão perversa da Escola Base, a história clássica de denuncia sem prova que a imprensa comprou e divulgou em tom de escândalo sem se dar ao trabalho de ouvir o outro lado.

A perversidade, no caso de Celso Daniel, é que jamais se fez autocrítica por tamanha irresponsabilidade. Ninguém se deu ao trabalho de ouvir a equipe do delegado Armando Costa Filho, responsável pela investigação inicial, para ouvir suas conclusões. Esse comportamento preventivo teve sua função. Permitiu realimentar, ao longo dos anos, um caldo de rumores, suposições e suspeitas que são servidos à mesa da luta política sempre que pode ser conveniente para emparedar o PT.

(Só para o leitor entender minha opinião. Inicialmente, cheguei a dar crédito à hipótese de crime encomendado. Isso porque aprendi, ao longo dos anos, a trabalhar com a noção de que ninguém pode ser condenado — nem absolvido — por antecipação. Mais tarde, após um esforço de investigação, ouvindo as duas partes, várias vezes, em várias entrevistas, cheguei a conclusão de que a tese de assassinato encomendado não para de pé, como tenho deixado claro em várias reportagens publicadas neste espaço. Numa reportagem de capa sobre o caso, a VEJA também chegou a conclusão de que a hipótese de crime de mando não se sustentava).   (247)

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