Lava Jato

Moro na mira da PF: entenda a operação determinada por Toffoli na 13ª Vara Federal, em Curitiba

Para Kakay, momento pode ser passo crucial para revelar questões gravíssimas sobre funcionamento da força-tarefa que marcou a história política do país.

Nesta quarta-feira (3), agentes da Polícia Federal (PF) cumpriram a ordem expedida pelo ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), e começaram a operação de busca e apreensão e recolhimentos de documentos relacionados a investigações ordenadas pela 13ª Vara Federal de Curitiba. A medida, de acordo com fonte ouvidas pela Fórum, pode ter efeitos “devastadores” para o senador e ex-juiz da Lava Jato, Sergio Moro (União-PR), figura central na engrenagem do lawfare que levou à prisão de Lula por 580 dias na sede da PF em Curitiba e ex-ministro de Justiça de Jair Bolsonaro (PL).

A ação tem como base o despacho emitido em 6 de outubro atendendo às solicitações da PF no contexto das denúncias apresentadas por Tony Garcia, que acusa Sergio Moro de ter conduzido investigações clandestinas relacionadas ao caso Banestado. Os relatos do ex-deputado estadual são o ponto de partida da operação hoje conduzida pela Justiça: Garcia afirma que, sob um acordo firmado com o então juiz, recebeu instruções para cumprir diversas “missões”.

Conhecido como “agente infiltrado” da Lava Jato, o ex-deputado afirma ter sido obrigado por Moro a realizar gravações ilegais em 2004, quando firmou um acordo de delação premiada após ser preso por fraudes ligadas ao Consórcio Nacional Garibaldi. Segundo Garcia, o então juiz o teria instruído a espionar autoridades que possuíam foro privilegiado, entre elas o ex-governador Beto Richa e ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Parte das provas que podem comprovar essas acusações estariam arquivadas na própria 13ª Vara Federal, o que motivou o pedido de diligências, segundo ele. Em sua decisão, Toffoli afirmou: “Defiro sejam empreendidas pela autoridade policial as diligências propugnadas, visando autorizar o exame in loco dos processos ali relacionados, documentos, mídias, objetos e afins relacionados às investigações”.

RELEMBRE: PF fará buscas na antiga vara federal de Moro após denúncias do “agente infiltrado” da Lava Jato

Em 2023, Garcia relatou ter colaborado com a Lava Jato por dois anos e meio, com direito a proteção policial e acesso a recursos da inteligência da PF. Ele também afirmou ter participado de ações de espionagem e chantagem que teriam mirado desembargadores do TRF-4, instância responsável por revisar as decisões da Lava Jato.

“Eu fui agente infiltrado do Ministério Público, trabalhei por dois anos e meio, com segurança e interceptações à disposição. Me fizeram de funcionário”, disse Garcia em entrevista.

A gravidade das acusações fez com que o caso fosse levado ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e reacendeu o debate sobre o lawfare – o uso político do sistema judicial – que marcou o período da Lava Jato. Segundo o advogado e jurista Kakay, ouvido pela TV Fórum, o inquérito aberto no STF com base nas denúncias de Garcia “pode desestruturar completamente a Lava Jato” e abrir caminho para a revisão de antigas delações.

“Ele chegou ao Supremo, mas não como queria”

Em entrevista ao programa Fórum Onze e Meia do dia 17 de outubro, o advogado criminalista não economizou palavras sobre Sérgio Moro. Para o jurista, a imprensa brasileira não vem dando a devida atenção à decisão do ministro Dias Toffoli.

“Um ministro do Supremo mandou fazer uma busca e apreensão, e essa busca e apreensão chama-se Sérgio Moro”, resumiu Kakay. Para ele, a medida é um passo crucial para revelar “questões gravíssimas” sobre o funcionamento da força-tarefa que marcou a história política do país.

“Pra onde foi o dinheiro dele? Ninguém sabe. A 13ª vara, existe um sumidouro, é muito importante essa busca e apreensão que está sendo feita agora”, afirmou.

Segundo Kakay, a falta de transparência nas movimentações financeiras e processuais daquela vara foi um dos elementos mais obscuros da operação. Ele afirma que a Lava Jato criou um sistema paralelo de poder, com juízes, procuradores e delegados atuando fora dos limites da legalidade. “Ele coordenava o que eu chamo de procuradores adestrados e parte da Polícia Federal”, disse.

Kakay acredita que a decisão de Toffoli abre caminho para uma devassa sobre a real extensão das irregularidades cometidas em Curitiba. “É importantíssima uma investigação que pode, de certa forma, mostrar ao Brasil quem realmente eram aqueles que determinavam os destinos do país”, afirmou.

Vale relembrar o relatório do Conselho Nacional de Justiça contra Sérgio Moro e assinado pelo juiz Luis Felipe Salomão, que apontou inúmeras regularidades nas práticas da Lava Jato.

O advogado também ironizou o atual momento político de Sérgio Moro, que deixou a magistratura para virar ministro da Justiça de Jair Bolsonaro (e chegou a ser cotado para o posto de ministro do Supremo Tribunal Federal), e hoje enfrenta uma série de investigações.

Além da busca e apreensão, o ex-juiz também é réu em um processo no STF por declarações ofensivas ao ministro Gilmar Mendes. Kakay considera inevitável uma condenação.

“É muito grave um juiz federal falar que ia comprar um habeas corpus. Mesmo de forma jocosa, isso é inaceitável. Eu acho que ele será condenado”, disse.

A consequência política, porém, não o entusiasma. “Essa condenação vai torná-lo inelegível, mas eu preferia vê-lo fora da disputa por uma condenação criminal referente à Lava Jato”, comentou. Para Kakay, os crimes que marcaram aquele período ainda não foram devidamente apurados.

“Ele chegou ao Supremo, mas não como queria”, provocou. “Ele precisa prestar contas sobre o que acontecia na 13ª Vara”, completa.

Do outro lado, Sergio Moro nega todas as acusações. Em nota enviada à imprensa, o senador afirmou:

“A defesa do senador Sergio Moro não teve acesso aos autos do inquérito, instaurado com base em um relato fantasioso de Tony Garcia. Não houve qualquer irregularidade no processo de quase 20 anos atrás que levou à condenação de Tony Garcia por ter se apropriado de recursos de consorciados do Consórcio Garibaldi. Como o próprio PGR afirmou, não há causa para competência do STF no inquérito, já que não há sob investigação ato praticado por Sergio Moro na condição de senador ou ministro.
O senador não tem qualquer preocupação com o amplo acesso pelo STF aos processos que atuou como juiz. Essas diligências apenas confirmarão que os relatos de Tony Garcia são mentirosos”.

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